segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Recortes de rascunhos inacabados

Sem lamentações o sol se pôs furado trazendo consigo a primavera gasta pelo tempo.


A mente cansada ao lado do corpo pesado se acomodam em uma cadeira de couro pregada no chão do passado com pregos do presente moribundo. Sentinelas que em outrora se sentiam injustiçados por sempre estarem presentes nas aulas e mesmo assim terem o mesmo tratamento dos ausentes como eu, hoje se tornaram os mais novos adeptos do ‘néon noturno de bairros seguros”....com o diploma de baixo dos braços é bem mais fácil. Assim como o poeta francês escreveu certa vez “a primavera me trouxe o pavoroso riso do idiota”


Atravesso o farol na saída da estação da Barra Funda e subo a viela...engraçado que ela é a mesma nos últimos cinco anos porém eu não...Um sujeito vende seus artesanatos nela eu paro para dar uma olhada...Oferece-me um pouco do seu vinho, ele por sua vez bebe um pouco de minha cerveja...sigo meu caminho...A cada dia que passa se torna mais difícil atravessar o parque e suas ruas vizinhas...passo reto e não subo...sigo a Matarazzo como sempre faço...Entro no estabelecimento em frente a outro farol...não sei para que serve o carro, só mata e polui...mas enfim cumprimento os funcionários....O Bigode me serve um Rum sem eu pedir...sem gelo como sempre...conversamos um pouco...realmente as coisas não andam fácil digo para ele!


Ele me perguntou se estou subindo, falo que sim....olho no relógio são 18:00 horas, minha aula começa as 19:40...tenho um tempo ainda penso comigo, no rádio começa a tocar Bob Dylan enquanto o céu desaba derrubando água para todos os lados...presto atenção nas luzes dos faróis dos carros parados no farol...entre eles um garoto atravessa correndo entrando no bar para fugir da chuva...sua mochila do programa aluno presente das escolas públicas do governo de São Paulo está gasta e molhada...ele encosta-se ao balcão e tira seus chicletes de dentro para ver se teve algum prejuízo...enquanto lamenta algumas caixinhas molhadas pela chuva esbarra em um sujeito de terno que toma um café com leite...o garoto pede desculpas e oferece uma cartela de chiclete para ele...”quero que você saia de perto de mim” o cara responde...o garoto abaixa a cabeça e vai saindo e indo para outro canto...olho para a cara do sujeito e vejo seu livro de direito no balcão...pergunto para ele se isso o excita ... finge não entender minha pergunta, então a repito – Você se excita ao tratar as pessoas do jeito que tratou o garoto?...ele não responde apenas fala que o garoto quase o molhou....olho ainda mais para ele e falo...Mas você acha que vai conseguir atravessar a Matarazzo nesta chuva sem se molhar? Você se acha melhor que alguém por que está usando um terno de risco de giz que as linhas nunca se encontram, ou por que tem um cartão do banco real ou por que faz um curso de direito que provavelmente depois de formado vai ficar anos sem passa na OAB? Era como se meu corpo estive-se possuído por algum espírito pagão....eu falava olhando para ele, mas sem saber como!


Ele me perguntou quem eu era...Disse para ele que eu não era nada e ele era um merda querendo chamar atenção...nessa hora o bigode se aproxima e me leva para uma mesa lá no fundo...quando sento nela vejo que o sujeito está atravessando a avenida na chuva, se molhando todo....sinto falta de minha bolsa e me lembro que a deixei no balcão, vou lá pegar ela...e vejo em cima dela uma cartela de chiclete, talvez em sinal de agradecimento, aquela cartela de chiclete valeu mais para mim que muitas “conversas” “intelectuais” e vazias de certos lugares...o garoto também já não estava mais lá...


Também resolvo enfrentar a chuva e subo para assistir minha aula, por causa da chuva hoje ninguém está vendendo nada na rua...nem o Bukowski com sua barraca de filmes,...Lembro-me que tenho que falar com ele para saber se ainda está de pé eu trabalhar com ele na feira da USP...


A professora ainda não chegou na sala...os rostos são estranhos na sala, me pergunto de onde eles surgiram...na próxima aula é meu seminário...ainda nem comecei a preparar ele...Literatura latino-americana...Gabriel Garcia Marques, Juan Rulfo, Pedro Juan Gutierrez...ainda não faço idéia do que falar...e sinceramente não estou preocupado...a cada dia que passa os corredores mais vazios...mais fantasmas caindo...sempre gostei da biblioteca aos sábados...o bar do mineiro na travessa da adega....indo para Sumaré...e depois algum show no Pompéia...voltar à noite pela estação da Água Branca, quer passarela mais soturna e cenário de algum conto do Poe que aquela? Space na São Bento...Masp de graça nas terças...Pinacoteca aos sábados...as brechas do centro velho de São Paulo, vielas, becos, Augusta e minorias...lojas de discos e vitrolas...sebos e brechós...chuva e sol...crentes pregando...bêbados e senhoras...policias e ambulantes...Angolanos e coreanos em seus respectivos negócios...Sensorial e as novidades musicais....Velvet sempre cara mas com seu charme...A ladeira que em outrora era habitada por burros de carga hoje me leva do Centro cultura de São Paulo ou para os teatros “independentes da Liberdade”...aproveito e passo na minha tia para ver meu avô...sempre com suas boinas...dizem que me pareço muito come ele...Acho que ano que vêm vou morar na casa dele no Paraná...Hora de ir para casa...condução cheia...e a vida mais vazia!

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. estou adorando esta fase...tão mais "humano" e atingível do que os textos de outrora.
    adoro "assistir" às suas andanças pelo centro.

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- Chegue diante do quadro sem intenção preconcebida de sarcasmo.

- Olhe para a pintura do mesmo modo como olharia para uma pedra talhada. Aprecie as facetas, a originalidade da formam, a luta com a luz, a disposição da linha e das cores [...]

- Escolher um detalhe que seja a chave do conjunto, fixá-lo por um bom tempo, e o modelo surgirá.

- Nessa última comparação, deixar-se levar até as regiões da mais requintada Alusão.

Max Jacob


Que os vasos se comuniquem!

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