Abro os olhos e percebo o quanto eu nada sei, apenas lembranças caminham em minha mente como serpentes em um deserto, a luz se apaga e mesmo assim, continuo a me ver do outro lado do rio.
Continuo deitado à espera de algo realmente novo, algo que me faça dançar sobre o cadáver de todos vocês. Estendo uma de minhas mãos até o chão e procuro meus cigarros, meu isqueiro, a chama do fogo me trás de volta para a realidade – eu não sei nadar!...
Os dias parecem caminhar longe de mim, porem as marcas de seus passos me perseguem, talvez seja pela minha escolha, ou quem sabe pela minha real falta de perspectiva em relação ao futuro.
Chamo-me..., é um nome estranho eu sei melhor que ninguém, eu o carrego desde que nasci ele nunca foi um problema para mim, na realidade, acho que eu causei muitos problemas a ele. Até certo ponto andamos juntos, mas chegou uma hora, que foi necessário nos separarmos. Isso faz muito tempo, tempo até demais, e com toda sinceridade, eu não compreendo o porquê de sua voz ainda alimentar meus sonhos e pesadelos.
No exato momento que fechei a mochila, e sai pela porta,... Ficou para trás, deixa-lo para trás, era o melhor para nós, hoje tenho certeza disso. Sua vida era diferente da minha, se eu seguir seu rumo, não teria como voltar, tive que fazer uma escolha e fiz.
O ônibus não demorou a passar. Ainda me lembro do rosto do motorista, a aliança em seu dedo, à satisfação que sentia em estar empregado. Sentei na janela, mas não olhei para fora, mergulhei dentro de mim mesmo, e percebi que tinha morrido naquele instante, e não fazia questão nenhuma de velório.
Acordo com o sol batendo em meu rosto, seu calor é intenso, percebo que algo está estranho, o sol se aproxima cada vez mais, ele está furado e sangra muito, ele está mais perto, não tenho como fugir; penso em me cobrir com minha coberta e fechar os olhos, mas não, prefiro encarar o sol e sua dor, eu abro a boca, e o engulo de uma só vez.
Mesmo distante, aqui neste apartamento minúsculo, onde mal cabem meus livros, os olhos de... Ainda me acompanham às vezes me vejo lá fora em um campo bem aberto com carneiros e ovelhas, correndo de um lado para o outro com... Nos braços, às vezes me sinto com se aquela tarde de primavera não tivesse acabado e todo dia ela se repetia, sem eu poder fazer nada, é engraçado, eu acordar com a certeza de que mais uma vez meus olhos serão arrancados, e mais uma vez eles vão rir de mim, toda noite antes de dormir, luto contra o sono, pois não quero acordar com a sensação de derrota mais uma vez, não quero ter q me levantar para recolher meus cacos e entrega-los de bandeja ao destino. Até agora o sono não veio, permaneço lúcido, imaginando coisas q gostaria de fazer, se amanha não fosse morrer, meus dias se concentraram em nascer e morrer, morrer e nascer, mas a cada dia renascendo mais fraco, e com menos esperança.
Não compreendo a importância que as pessoas dão ao tempo, umas dançam com ele, outras brigam com ele, mas ambas estão com ele, dependem dele. E não conseguiriam viver um só dia sem os ponteiros do relógio, a partir do momento q resolvi entrar naquele ônibus, minha noção de tempo foi perdida, a cada dia q passa eu sei menos quem eu sou, e isto é bom, isto faz com que eu me volte para dentro de mim mesmo.
Às vezes eu escuto alguém me chamando, às vezes eu sinto alguém tocando meu ombro, mas quando me viro, não vejo ninguém. Aliás, vejo sim, vejo minha cama com seu lençol.
Está noite eu não imaginei ninguém me tocando, nem escutei nenhuma voz, é engraçado que está noite não está fria, está noite você voltou e ficou do meu lado, não olhei para trás, mas sabia que você estava do meu lado.
Está noite minha cama está sem lençol, nesta noite eu vou embora para outro lugar, não mais vou imaginar coisas nem vozes, não mais vou me assustar com o calor do sol, também não vou mais te esperar sentado em minha cadeira de couro. Nesta noite vou para outro lugar, que provavelmente vai ser pior que este, mas com certeza será diferente.
Hoje eu não me imaginei senti um campo aberto, com lírios e rosas, mas desta vez não foi em seu caixão, e sim em um campo aberto, foi uma vez que você não veio me segurar à mão. Até logo minha companheira de anos, eu vou embora e levarei comigo uma lembrança sua, para não te esquecer levarei seu consolo.
Às vezes eu penso em coisas e como elas são engraçadas
Às vezes me vejo dançando em uma tarde de domingo com um cão pulando ao meu lado em um jardim de flores raras.
Às vezes eu penso às vezes me esqueço da realidade, e de como ela é fria.
Está noite não teve pão com leite, nem conversas, muito menos uma boa noite.
Às vezes eu penso se a alguém lá fora
Às vezes eu penso se lá fora eles conversam.
Às vezes eu imagino, eles me chamando para conversar em uma mesa de bar.
Está noite a cela está vazia, ela está fria e gelada.
Às vezes eu imagino coisas bonitas, e me pergunto o que fiz.
Olho mais uma vez para minha cama, e ela está sem lençol
Depois deste monológo sob efeitos dos mais variados tipos de destilados, Moloch abaixa à cabeça e começa a chorar dando murros na mesa, sua taça de vinho cai sobre a mesa, molhando a nota que já havíamos pedido, enquanto olho para o valor da conta manchada de vinho dou uma tragada no cigarro e me pergunto, para aonde vamos neste inicio de madrugada fria.
Texto: Fragmento do terceiro capítulo do livro (A Dança), por Juan Moravagine Carneiro
Imagem: Cena do filme que está entre os meus preferidos (O sétimo selo), de Ingmar Bergan
Rafael. O livro: A Dança é de qual autor? Para que possa procurá-lo, pois amei o pouco já lido.
ResponderExcluirAbraços.
Priscila Cáliga
Impossível comprar...pois o mesmo nunca foi publicado pois ainda não está pronto e para falar a verdade acho que nunca vai estar...
ResponderExcluirO autor em questão sou eu...
abraço!
Deitado é o pior jeito das coisas acontecerem, rs.
ResponderExcluirAMO O sétimo selo. É um dos meus filmes favoritos.
meu caro, leitura apaixonada a que inevitavelmente se faz deste belíssimo trecho que conjuga a narrativa e a sensibilidade da poesia. sublinho a derradeira frase: "para onde vamos neste início de madrugada fria?". ainda esperas resposta? eu deixei de fazer a pergunta há muito...
ResponderExcluirum abraço com amizade!
A solidão não sabe dançar, mas sabe como inventar desculpas por não ter aprendido. Consolos não consolam quem tem fome de viver pra fora e não apenas para dentro.
ResponderExcluirNão tenho nem palavras para comentar ._. ... você sabe que adoro tudo o que você escreve.
ResponderExcluirEu gostaria de ler um livro seu (:
Beijos!
Perfeito!!!!!
ResponderExcluirSuas escritas são maravilhosas.
Tenha uma semana especial.
Com carinho, LADY.
Juan, um livro que nunca vai estar pronto... Será? Acho que ele já existe, se fecha e se abre a cada págian escrita. Um dia haverá a última página, que dará passagem à primeira de um outro livro. E assim somos! Com essas reflexões, eu o leio...
ResponderExcluirAbraços,
Tânia
Olá meu caro,
ResponderExcluirque interessante!
o que estou à procura sobre Manoel de Barros é o documentário “Só dez por cento é mentira”. Conhece?
Minha professora disse que é maravilhoso, e que por obrigação tem que ser visto, apreciado, sentido...
Hum... ainda não assisti O Sétimo Selo.
na verdade estou sem tempo para vê muitas coisas =/
vou acrescentar na minha lista :)
abraços!
"...luto contra o sono, pois não quero acordar com a sensação de derrota mais uma vez, não quero ter que me levantar para recolher meus cacos e entregá-los de bandeja ao destino..."
ResponderExcluirMa-ra-vi-lho-so... um autor é bom quando consegue escrever o que a gente sente do jeito que a gente gostaria de escrever. Quando ficar pronto, me avise. Quero ler.
Adoro suas visitas.
Uma ótima semana pra vc.
Beijos.
Lindo, lindo seus escritos.
ResponderExcluirMaravilhoso mesmo...
Bjs
Mila
O que dizer, me sentia inteira lá dentro, me sentia: ela, ele e eu lia e estava lá imagiando (parece tanto comigo)! minha bendita solidão... o meus cigarros queimando ou a vontade de beber desse vinho até cair... na mesa e esbarar sua taça... e depois... pedir: me dê um cigarro!!! Estou me deliciando e me emocionando!!
ResponderExcluirHoje parei de fumar!
Juan...li esse texto, seu texto, umas mil vezes.
ResponderExcluirE fiquei pensando tanto em algumas coisas..
Em decisões que a gente as vezes tem que tomar, o que ela nos causa..
As saudades que ficam marcadas a ferro na nossa alma, por mais que os anos passem. A marca esta ali.
Mas as vezes a gente passa a olhar a ferida com outros olhos. Com uma certa leveza.
De ter feito as melhores escolhas ou não.
O tempo volta atrás? A gente recupera o tempo perdido?
Não sei meu amigo.....sinceramente não sei.
Desculpe "Divagar" aqui, mas seus textos me prendem. Me tocam, e de alguma forma fala comigo.
Sorver as suas palavras, me alimenta.
Um grande abraço meu querido.
Rafael
ResponderExcluirQuantas imagens lindas eu encontro neste teu texto. Ele vai crescendo e nos prendendo na tua DANÇA! Linda dança...
Bj grande
É quando a água bate na bunda, que a gente aprende a nadar...
ResponderExcluirLinda semana pra ti
Bjs
Livinha
deveria publicar!!!
ResponderExcluirSempre chega o dia da decisão, de tomar um rumo, de conhecer o mundo, se conhecer.
ResponderExcluirBeijooO'
eu encotro enfim Juan "a paixão dos suicidas que se matam sem explicação" na sua Dança
ResponderExcluirperder-se na sua poética é facil, perder-se na de outra pessoa é divino, é preciso que essa outra pessoa escreva algo que valha a pena o leitor dar-se o desespero
essa foi uma experiência para mim
foi a nódoa de lama que Bandeira falava
Eu nunca quero acordar.
ResponderExcluirMaravilhoso escrito =*
então participa da promo, vai ser uma grande honra te ter lá comunidade
ResponderExcluirgrande abraços
é terei q vir com mais tempo, mas seria melhor em um livro, talvez um dia de sol na varanda de casa.
ResponderExcluirabraço
ns
Tem tudo para ir adiante, Juan.
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