quinta-feira, 13 de maio de 2010

É preciso desaprender a escrever

"É a maneira que tenho de pensar a vida com mais profundidade. Quando a vida me agarra, me força a refletir sobre ela, é então que nasce o poema. Li vários filósofos, tenho uma porão de idéias, minhas e alheias, mas tem um momento EM QUE ISSO NÃO VALE NADA. Defronto-me com o mundo indecifrável e aí começo esse pensar que resulta no poema. Trata-se de uma questão de vida ou morte"...


"Antes, amadurecia bastantea idéia, ficava pensando o poema na cabeça. Quando me sentava para escrever, já tinha mais ou menos um rumo de por onde o poema ia e ele quase que saía de um jato. Depois modificava apenas uma coisa ou outro.
Atualmente, minha técnica de criação é diferente, eu escrevo dez, quinze vezes o poema. Quando sou motivado, comçeo um primeiro borrão ainda sem um rumo. Em seguida, incorporo outras idéias, em um processo bastante indeterminado. Me agrada nõa saber onde vou chegar. Na verdade, estou desaprendendo a escrever. Hoje, tenho meno domínio técnico. Quando a poesia se restringe à pura técnica, o poema nõa vai além da superficie. Na arte, em greal, quando a técnica se torna hábito e domina a realização, dificulta-se o surgimento do novo"


"Nunca penso assim: é preciso adotar providências. Embora eu seja bastante lúcido em relação a outras coisas, nunca teorizo sobre minha poesia. Apenas observo o que vai acontecendo e procuro me comportar dentro disso. Aliás, acho que minha poesia tem uma tendência para a desordem.
O poema não possui uma forma fatal. Tanto pode sair uma coisa, como outra. A idéia da obra-prima insubstituível, feita exatamente como tinha de ser, não é verdadeira. Se você for escrever o mesmo poema seis meses depois, sai outro. O tema, as idéias permanecem, mas a realização é diferente.
A vida não é determinada, ela é uma invenção. O prrincípio da incerteza da física quântica nõa impera só na dimensão infra-atômica. Na vida normal, é evidente que procuro, tanto quanto possível, pôr ordem nas coisas. No entanto, quando estou fazendo poemas, sou mais livre, mais indeterminado do que quando vou ao mercado"


Texto: Fragmento de uma entrevista de Ferreira Gullar para a revista Entre Livros, por Ricardo Musse, Ed. Duetto (Direitos reservados)

Imagens: Foto de Ferreira Gullar e cenas do maravilho filme (PI), de 1998. Dirigido por Darren Aronofsky

27 comentários:

  1. acabam de me oferecer uma preciosidade: a "novíssima cartilha ilustrada", cujo subtítulo é, justamente, "(des)aprender a ler e a escrever". nem de propósito (hehehe).
    um abraço!

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  2. a "não técnica" vem depois da "técnica".

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  3. "Li vários filósofos, tenho uma porão de idéias, minhas e alheias, mas tem um momento EM QUE ISSO NÃO VALE NADA".

    Brilhante e exata afirmação. Há horas em que tudo que se viu/apreendeu não resulta em uma linha.

    P.S.: obrigada. Não posto muitos textos meus pois já escrevo muito para os empregos, e falta tempo e energia para escrever sobre o que desejo. Às vezes acontece de escrever algo "de trabalho" que eu goste, e vai para o divã :)

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  4. Engraçado como meu jeito de escrever é uma mistura dos jeitos dele

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  5. Juan
    Gostei das tuas pinceladas...

    POEMA




    Poema…
    Poema lindo e belo…
    Poema que me transforma…
    E que me leva bem longe…
    Sinto que ao ler-te...
    O meu pensamento voa, voa alto…
    E eu salto para o outro lado…
    E lá… sinto que sou outra…
    E vejo…um mundo belo…
    Um mundo de sonho…
    Porque o poema é lindo…
    Escrito por quem o sabe escrever…
    E leva-me para longe…
    Para me poder transformar…



    Lili Laranjo

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  6. Oi Juan...

    Novamente aqui, agora pra comentar...rss

    A forma de escrever de cada poeta é uma experiência única e individual. Como Gullar bem colocou.
    Dele, guardo comigo estes versos:

    "Uma parte de mim pesa, pondera: outra parte delira."


    Bom receber a tua visita também!

    Um grande abraço

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  7. Esse grande poeta que amo diz coisas que nos fazem pensar. O poema vem de uma ordem ou de uma desordem? É mesmo difícil de saber. Sai inteiro o que às vezes foi dito pela metade. Sai metade o que foi dito inteiro. De onde vem vem o poema antes que exista? Quem sabe... Adorei o post e amo o poeta, de quem, aliás, peguei emprestado o Traduzir-se para o meu perfil no blog. Adoro as palavras alheias! rs

    Abraços,
    Tania

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  8. mais do que técnica escrever poesia é sentir.
    Um beijo

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  9. Olá Juan!
    Obrigado pela sua visita, adorei seu espaço...
    E posso te falar com sinceridade que a poesia mais linda é aquela que nasce quando pensamos não estar inspirados, quando não vemos nada, é de lá que ela sai como uma arte...Escrevo livremente, sem métricas e me sinto bem assim sabe...externo só pensamentos...
    Bjs da Mila!

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  10. Caro Juan, prezado. Orgulho-me de teus comentários. Pasmo-me! Ainda por cima, colocas o Gullar, a quem gosto muitíssimo e, que citou em 27/12/1982: "Está na tua boca, na minha boca, a palavra que eventualmente se converterá em beleza. Ou não." Como vês, somos reféns da linguagem, as vezes, com letras. Um bom abraço. jbaiao

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  11. :) bonito como escrever é bonito, grande cara esse gullar.

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  12. Cada um é um. concordo com o que diz a Lilian,"mais do que técnica escrever poesia é sentir"...
    abraço

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  13. Eu travei de vez. Faz dias que estou tentando escrever algo, sairam três ou quatro linhas. Desisti (de novo...).

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  14. Que maravilha esse texto.

    aprecio muito o Ferreira Gullar.

    obrigado pela visita meu querido :)
    é sempre bom quando você passa por lá.

    beijo!

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  15. Linda compilação de textos, muito bem escolhidos. Gratificante lê-lo ao final do dia! Obrigada! Deia

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  16. ideias maduras sempre caem no chão. bom mesmo é ir vomitando, com diz Abreu, depois a gente colhe a flor.

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  17. Te encontrei em blogs afins.
    Excelente texto!
    Mas a poesia se estabelece ali, no intangível, indecifrável e, portanto, o poema é mais que a técnica.

    abraços

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  18. A maioria das vezes não sei onde vai dar, nem forma, nem estrutura, nem linguagem. Algumas vezes a idéia me persegue, outras vezes irrompe numa combustão espontânea.

    P.S - Sou bicho muito curioso, fiquei me perguntando o que anotou para pesquisar (rsrs)

    beijão

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  19. Bom que teus ventos sopraram pras terras de cá... Gostei do clima, do aroma e do bom tempo que faz por essas bandas!

    [agradáveis brisas]

    ..sorriso, paz e arte..

    .ventura.

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  20. Q maravilha essa entrevista! Gosto demais desse cara! Esse jeito maluco! valeu demais... Excelente contribuição!

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  21. Nosso Blog abriu a Seção Enfoque Educacional.
    Nosso convite está aberto a todos que se interessam pelo tema.
    Aproveitamos a oportunidade para desejar aos amigos um ótimo fim de semana.
    Um abraço carinhoso

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  22. Pois é...de sa pren der
    me parece um verbo
    que esta sendo imposto
    aos que ainda creem em algo...
    Mas ha o lado ruim e o lado bom. Mas nunca se tratando de desaprender
    nossa escrita
    ou o que ainda temos de bom em nós.
    Temos ne?
    Bjins entre sonhos e delírios

    Despudorada-Mente Eu
    Hoje
    na verdade
    queria despir-me.(...)Reflexo d'Alma

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  23. Juan

    "Quando a poesia se restringe à pura técnica, o poema não vai além da superficie"


    Poesia é mergulho, até onde o nosso fôlego aguentar! Quanto mais nos tira o ar, melhor fica!


    Lindo texto do Gullar.
    Obrigada pela partilha e pela presença sempre carinhosa no meu Encantaventos!

    Bj grande!

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  24. Genial! Técnica de desaprender a escrever pra melhor fazer... ;)

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  25. "Me agrada nõa saber onde vou chegar." !!!

    Escrevo como quem afaga um corpo no papel...

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- Chegue diante do quadro sem intenção preconcebida de sarcasmo.

- Olhe para a pintura do mesmo modo como olharia para uma pedra talhada. Aprecie as facetas, a originalidade da formam, a luta com a luz, a disposição da linha e das cores [...]

- Escolher um detalhe que seja a chave do conjunto, fixá-lo por um bom tempo, e o modelo surgirá.

- Nessa última comparação, deixar-se levar até as regiões da mais requintada Alusão.

Max Jacob


Que os vasos se comuniquem!

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